Yuri Kiddo, da Cidade Escola Aprendiz
Adolescente trabalhando no Brasil só na condição de aprendiz, a partir dos 14 anos, antes dessa idade é proibido por lei e não é à toa. A luta pela sensibilização e conhecimento sobre o trabalho infantil vem crescendo nos últimos anos com campanhas, políticas públicas, denúncias e fiscalização, porém não é difícil se deparar com pessoas a favor de meninos e meninas em atividades laborais. As justificativas são diversas, das questões de classe social à cultura da naturalização da exploração infantil e que o trabalho “enobrece o homem”. Nenhuma delas para não levar em consideração os impactos e as consequências da criança ser obrigada a pular uma das fases mais importantes da vida: a infância.
“A sociedade tem que entender que o trabalho infantil não traz benefícios, pelo contrário, atrapalha o desenvolvimento de crianças e adolescentes, causando prejuízos à saúde, à educação, ao lazer e à convivência familiar”. A afirmação é do coordenador nacional de Combate à Exploração do Trabalho da Criança e do Adolescente (Coordinfância) do Ministério Público do Trabalho (MPT), Rafael Dias Marques, que chama a atenção e corresponsabiliza a população em geral. “No momento em que a sociedade se conscientiza, passa a ser um agente de cobrança do poder público para que políticas públicas sejam desenvolvidas e essas crianças e adolescentes possam se desenvolver de maneira integral”.
Nessa percepção, Marques faz uma triste análise. “Muitas dessas crianças e adolescentes estão perdendo a sua capacidade de elaborar um futuro porque estão desenvolvendo doenças de trabalho que os incapacitam para a vida produtiva quando se tornarem adultos. Essa é uma das mais perversas formas de violação dos direitos humanos de crianças e adolescentes”.
Impactos e consequências
Toda pessoa que trabalha está sujeita a acidentes, doenças e, inclusive, morte no trabalho. De acordo com o Ministério da Saúde, crianças e adolescentes se acidentam seis vezes mais que adultos em atividades laborais, e pelo menos três se acidentaram por dia trabalhando no Brasil de 2009 a julho de 2011. Nesse período, no mínimo 37 crianças morreram trabalhando, sendo que um deles não chegou sequer aos 13 anos. Os dados referentes a acidentes com pessoas com menos de 17 anos foram coletados pelo Ministério da Saúde a partir de comunicação de hospitais e postos de atendimento. “Nesse primeiro ponto de vista, só nesse universo, nós já visualizamos que o trabalho precoce compromete aquilo que há de mais caro na pessoa: a sua vida e a sua saúde”.
Os impactos de trabalho para adultos e crianças são muito diferentes fisiológica e psicologicamente, podendo apresentar resultados devastadores para crianças e adolescentes, como explica a médica diretora da Associação Nacional de Medicina do Trabalho (Anamt), Marcia Bandini. “Eles são mais suscetíveis por estarem em fase de crescimento e desenvolvimento, têm maior vulnerabilidade social com menor percepção de perigos e, frequentemente, não têm sequer tamanho suficiente para o uso de equipamentos de proteção, que são destinados a adultos”.
Além da perda de direitos básicos como educação, lazer e esporte, as crianças e adolescentes que trabalham podem sofrer consequências irreversíveis. “Os trabalhos que exigem esforço físico extremo, como carregar objetos pesados ou adotar posições anti-ergonômicas, podem trazer danos irreversíveis ao crescimento da criança”, afirma Bandini. Devido a pouca resistência, a criança está mais suscetível a infecções e lesões, em relação ao adulto. Em termos psicológicos, a médica aponta o abuso físico, sexual e emocional também como principais fatores de doença. “O trabalho infantil cobra seu preço na saúde física e mental, bem como na inclusão socioeconômica das crianças de adolescentes”.
Aos efeitos à saúde mencionados anteriormente, devemos saber de outros porque a lista de lesões é grande. Fraturas, amputações, ferimentos cortantes ou contusos, queimaduras e acidentes com animais peçonhentos, por exemplo, são comuns em boa parte de trabalhos do tipo rural, em construção, em pequenas oficinas, na pesca, em processamento de lixo. “Crianças e adolescentes estão sujeitos a acidentes de trabalho que não são devidamente percebidos pelo sistema de saúde, já que a notificação é precária por se tratar de trabalho ilegal”, denuncia a médica do trabalho, que chama a atenção aos atendimentos na área da saúde. “Quando a criança ou adolescente é atendido no SUS, é necessário investigar as condições que levaram à lesão e, em caso de trabalho ilegal, é preciso notificar o incidente ao Sinan (Sistema de Informação de Agravos de Notificação), ao Conselho Tutelar e a Delegacia Regional do Trabalho. O profissional de saúde pode e deve exercer seu papel social no combate ao trabalho infantil”.
Há também comprometimento ao aprendizado e a escolaridade, impedindo que a criança ou o adolescente tenham uma inclusão social e econômica adequada, afetando assim o indivíduo e o país. “Toda criança ou adolescente que trabalha, acaba se cansando muito facilmente. No momento em que ele consegue acessar a escola, não assimila os conhecimentos para desenvolver as suas habilidades e competências. Educação e saúde demonstram como uma situação de trabalho infantil pode prejudicar”, conclui Marques e propõe a necessidade do Estado evoluir para responder ao trabalho infantil e oferecer escolas e educação em tempo integral. “Para que a criança esteja todo o dia ocupada na escola, desenvolvendo suas habilidades psíquicas e de lazer, sociabilidade, cidadania, em todas as esferas para que, no futuro, ela possa ser cidadã”, afirma. A diretora da Anamt completa. “Lugar de criança é na escola, brincando e aprendendo”. Quem ainda discorda?
Fonte: Pro menino
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