quarta-feira, 19 de dezembro de 2012

Pai ausente

Por: Maria Berenice Dias
Na tentativa de reverter o exacerbado número dos chamados “filhos de pais desconhecidos” – crianças, adolescentes e jovens cujo registro de nascimento consta somente o nome da mãe – o Conselho Nacional de Justiça resolveu agir.
Primeiro instituiu o “Programa Pai Presente”, por meio do Provimento nº 12/10, determinando às Corregedorias de Justiça dos Tribunais de todos os Estados que encaminhem aos juízes os nomes e dados dos alunos matriculados nas escolas sem o nome do pai, para que deem início ao procedimento de averiguação da paternidade, instituído pela Lei nº 8.560/92. O recente Provimento nº 16, de 17.02.12, autorizou a adoção do procedimento inoficioso não só por ocasião do registro do nascimento. Agora tanto a mãe como o filho maior de idade, podem comparecer perante qualquer Cartório do Registro Civil e apontar o suposto pai. O Oficial do Registro Civil toma por termo a informação e comunica ao juiz para que dê início à averiguação da paternidade. O magistrado, depois de ouvir a mãe sobre a alegada paternidade, notifica o genitor para que se manifeste sobre a paternidade que lhe é atribuída. Sempre que houver silêncio, omissão ou negativa, ao Ministério Público cabe propor ação investigatória de paternidade.
Ou seja, não tem qualquer significado nem a palavra da mãe e nem do filho. Para o registro é indispensável a confissão do pai. Ainda que tenha ele sido convocado judicialmente, o seu silêncio ou singela negativa não gera qualquer consequência. O procedimento levado a efeito de nada valeu, não gera qualquer ônus, não tem nenhuma eficácia. Sequer supre a necessidade de ser o réu citado na ação investigatória de paternidade.
Mas há outro fator a ser atentado. De todo descabido atribuir ao Juiz de Direito o encargo instaurar o procedimento e realizar as audiências, providências que bem poderiam ser de responsabilidade do Juiz de Paz, a quem a Constituição Federal atribui competência para exercer atribuições conciliatórias sem caráter jurisdicional (CF, 98, II).
A forma mais eficaz de assegurar direito ao registro seria notificar o indicado como genitor para reconhecer o filho ou comparecer em dia e hora já designado para submeter-se ao exame do DNA. O silêncio ou a ausência à perícia ensejaria o imediato registro do filho em seu nome. Cabe lembrar que a Lei nº 12.004/09 gera a presunção de paternidade de quem se recusa em se submeter ao exame de DNA. Esta seria a única forma de assegurar ao filho o direito de ser reconhecido.
Afinal, ninguém vai querer assumir a paternidade, que impõe obrigações e encargos, se tem a chance de relegar tais reponsabilidades para um futuro, às vezes bem distante. As consequências dessa omissão são severas. Subtrai do filho o direito à identidade, o mais significativo atributos da personalidade. Também afeta o seu pleno desenvolvimento, pois deixa de contar com o auxílio de quem deveria assumir as responsabilidades parentais. Como sempre é a mãe quem acaba assumindo sozinha um encargo que não é só seu.
Enquanto não for reconhecido que o direito prevalente é do filho, com a adoção de mecanismos eficazes para que o pai assuma os deveres decorrentes do poder familiar, a sociedade continuará sendo conivente com a irresponsabilidade masculina. A conta quem paga é o Estado que não pode se furtar de cumprir o comando constitucional de assegurar a crianças, adolescentes e jovens, com absoluta prioridade, todos os direitos inerentes à cidadania.

MARIA BERENICE DIAS é Advogada e Vice-Presidenta Nacional do IBDFAM. Dialex. Ano XXX Edição nº 80 Brasília, quarta-feira, 25 de abril de 2012. Ed. Consulex

Nenhum comentário:

Postar um comentário